Um penal entreaberto,
folhas vítimas de seus traços, ora inspirados, ora apenas por descaso. Era o
que ele via. Uma garrafa que ainda restava água de dias atrás, e uma montanha
de livros que serviram de banquete durante madrugadas como aquela. Ele devorara
todas as palavras de forma a saciar sua ansiedade.
Uma melodia que ecoava
rouca, intensa, como se um chamado. Eram os cães da madrugada que ele ouvira.
Sapatos, que agora já não
passam de trapos, espalhados pelo chão, sobre aquelas 64 cerâmicas que ele já
contara o dobro de vezes.
Percebeu-se parado, quieto,
sentado de forma desconfortável aparentemente, mas não estava. Ele fitava o
nada, estava neutro. Ficava ensurdecido com o vazio, porém, se sentia parte da
harmonia, vazia.
Sua mente, inóspita,
somente degustava a solidão, que sempre fora sua aliada. Ele podia sentir-se
parte daquele sagrado local. Como se aquela jaula branca o condenasse a estar
ali.
Ele levemente, sentiu-se
instigado, algo invadiu sua mente, sentiu já ter sido aquilo, ouvido e sentido,
como uma fita que se repete.
Mas um desconhecido se
manifestou. Quando moveu o braço involuntariamente, se assustou, agarrando um
revolver. Ele queria soltar, queria chorar, mas não pôde. Sentiu o braço fazer
o movimento de arco, um peso estava em sua mão. Algo gélido tocou a lateral
direita de sua cabeça procurando um orifício para se enfiar. Achou, seu ouvido.
Ele temeu, queria gritar, queria a mãe, queria pedir desculpas, dizer eu te amo...
O estrondo ecoou mais que os cães que latiam.
Instantes depois, passos
firmes e ligeiros se revelaram. A gaiola fora invadida, e as cerâmicas marrons
davam lugar a uma poça escarlate, vinda de uma nascente sem vida. O horror e a
tristeza eram notáveis na face da mulher, que estava aos prantos, mergulhando
em busca do filho. E ele que nada entendia, observou, sentado, sem poder
chorar, sem poder se desculpar. Agora, ele é parte dessa sinfonia.
-Pedro H. Campos