Eu me sinto um forasteiro, alguém
que não pertence a lugar nenhum. Dias e dias e eu sou capaz de notar o quão
perdido estou, todo o conhecimento sobre o tempo me escorre por entre os dedos, assim como a areia que cai lenta e constante dentro da
ampulheta. Estou a espera do momento em que eu mesmo hei de voltar a ser
cinzas. Estou estagnado pelo destino, fadado a vagar por terras estranhas,
nunca podendo criar laços com a própria terra e nada que dela prover. Marquei
diversos caminhos, assisti o pôr do sol inúmeras vezes de forma que já nos conhecemos e, todo início de noite,
nos despedimos com um aceno cálido. No céu,
se levanta minha velha amiga, prisioneira da noite e, assim como eu, sem chances de brilhar por mais que algumas
horas ou dias em um mesmo lugar. Obrigada a vagar pelos céus.
Oh, Iluminada Lua, Filha de Ártemis, Símbolo da Mulher. Me permita
descansar sob seu olhar, enquanto aguardo a última brisa desse gélido lugar.
Enquanto cada estrela pinga com o pontilhismo de explosões inimagináveis.
Mais um Dia me acordou Senhor Sol, mesmo que já tenha lhe pedido que
não o fizesse. Sei que possui boas intenções. Entretanto, eu
só quero poder encontrar um lar, onde possa dormir e deixar que minha
respiração volte para o mundo, que é onde ela deve estar. Livre.
Houve um dia em que caminhei sobre as águas. Não
assim como Nosso Senhor Jesus, mas,
sim, como uma libélula que
descansa ao barulho da água logo
após um satisfeito voo. Tinha os joelhos três centímetros abaixo do nível da
água, com um frio agradável subindo a espinha. Os raios de sol furavam a capa
feita de folhas, aquecendo as partículas do meu rosto. O barulho da água caindo
da enorme cachoeira, causava um
grande barulho, mas ainda assim, relaxante. Era triste olhar para a
margem e saber que nunca poderei sentir a água sobre a pele novamente, mas
ainda me alegra poder descansar após um longo banho.
Caia Linda Água, e forme espumas de memórias, que se
explodem ao menor dos toques. Caia Linda Água, e limpe a alma dos já
caídos. Caia Linda Água, e reflita como espelho da
verdade. Caia Linda Água, e me purifique o ser. E,
ainda que eu deixe de sentir o seu cair, jamais hei de esquecer seu doce som,
seu leve toque e seu poderoso sabor. Caia, Oh Linda Água.
Crepitando dentro do fogo
selvagem a madeira grita a cada fio de vida que perde. Não há beleza no fim
absoluto de uma vida, mas até mesmo as árvores tão ancestrais, historiadoras
importantes, conseguem sentir a beleza que é o sacrifício pelo fogo puro,
aquele que ilumina uma jornada pelo escuro do submundo. Eu consigo ver todos os
sentimentos que já tive durante essa minha vida, eles queimam uma última vez, até o momento mais calmo em que, enfim, irão se
apagar e nunca mais pulsar novamente.
Amado fogo, precisa me ajudar. Eu pequei, mas bem sei eu que tu
consegues me salvar. Não sei mais a quem implorar, mas, Oh Impiedoso e
Destruidor Fogo Infernal, queime minhas impurezas e me esterilize
a alma. Ilumine as linhas com que teço minha sina, com gestos rápidos e
precisos. A arte mais linda e que possa alimentar sua existência, Oh Fogo Da
Vida.
Me perdeu, tomei demasiado de seu
tempo, mas já não tenho tempo para permanecer aqui, já preciso partir. Preciso
correr, a cavalaria está chegando, preciso mudar e encontrar uma terra onde é
lindo e nobre a morte da mais miserável vida. Uma Terra de Ninguém, livre de
ligações, de amores, medos,
desejos, ódio e o que mais a humanidade possa usar para envenenar todas as
terras.
Adeus!
Marionete de Suas Vontades
Pedro Henrique