É assim que a paixão acontece: seja na escada da faculdade, no ônibus ou no mercadinho da esquina. Ela costuma ir embora tão rápido quanto chega, pelo menos, com Helena sempre fora assim. Ela percebera que, quando há paixão, há um padrão: nos atentamos a detalhes tão pequenos que, juntos, criam expectativas intensas -  mas nem sempre são recíprocas. Então, surgem as pequenas ansiedades, começa-se a tomar mais cuidado com as palavras, com as atitudes - ninguém quer passar uma impressão ruim logo de cara.  Mas além de tomar cuidado com tudo isso, existe algo bem mais importante a se preocupar: as emoções. Na verdade, ninguém nunca quer que coração algum saia magoado -  mesmo sabendo que isso, provavelmente, vai acontecer porque a paixão é uma faca de dois gumes. Faca de dois gumes, livro de duas faces, apesar do medo, com a paixão tudo se torna melhor: acordar cedo, estudar, trabalhar e até pegar aquele ônibus lotado em plena segunda-feira. Esse é o alerta, quando começamos a incluir, imperceptivelmente, os detalhes ao nosso dia a dia, criando, imaginando e acrescentando um outro alguém à nossa história. Imaginação e realidade se confundem, até você ser pego em meio a um pensamento intenso com alguém que acabara de conhecer e percebe que está se apaixonando, ao passo que sua mãe e todo o resto do mundo sacaram depois do seu último texto. Sempre parece que vai ser diferente, mas era sempre assim, e Helena sabia.   

Helena, 26 anos, prestes a dizer sim, com os votos em mãos. Envolvida em uma paixão desde adolescência na qual sentira-se muito confortável, até o dia em que ele tomou a mão dela em casamento e, precipitada, ela aceitou. Os dias se passaram e o tempo a engolia: precisava escrever seus votos. Começou, rascunhou, reescreveu e, quando percebeu, tinha rabiscado um começo:


Eu esqueci de ser livre, esqueci de viver em plenitude, esqueci que nunca foi amor, foi paixão. ” 

Naquela tarde de dezembro descobrira que  tudo estava fora do lugar, percebeu que havia esquecido algo, que por muito tempo ignorara as indiferenças, achando que estava bem, ou que tudo ficaria bem.  Assim, seus votos se transformaram em uma despedida:

“Se você decidiu guardar, então guarde, porém não me aguarde! Não se guarde, não guarde teu coração, por nada que vivemos. Não vivemos nada comparado com o que a vida ainda tem a te oferecer, com o amor que vai chegar. Apenas viva, sorria, jogue basquete com os amigos, vá ao treino, estude, cante, componha, viaje pelo mundo, faça novas amizades, novos sonhos - é isso que deve ser feito. Se permita curar e, quando estiver preparado, se entregue a um amor - um amor real, sem paixões loucas, sem atitudes precipitadas.
Eu sei, é bem provável que você esteja estranhando toda essa minha garra para viver, e tem todo o direito já que meses atrás eu vivia à sombra de toda nossa rotina, eu ainda remoía todas as "declarações de amor", fazia questão de deixar claro para você tudo o que sentia. Mas não foi só você, mais ninguém acreditou quando eu disse que estava tudo bem. Mais uma última coisa:  faça o que tiver que fazer e não se lembre de um amor que não existe e que não vai voltar.

PS.: Te devolvo tudo que é seu, inclusive o seu coração, porque assim você já pode ir embora.
 Minhas sinceras desculpas."


Vai chegar um dia em que, depois das paixões, o amor chegará. E nele tudo é de verdade, não tem essa de ser frio ou quente, você não tenta ser nada, você apenas é.  Helena ainda não havia sido, mas haveria de ser.

May Mariano (do blog: http://www.mayentrandonoassunto.com/?m=1)

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