Caí na farsa. A ilusão de que sempre tem alguém que gosta menos e que é vantajoso ser esse alguém. 
De fato, não raramente, existe um lado que gosta mais e, consequentemente, um que gosta menos. A tv, o cinema, a música, as praças e os livros estão abarrotados de histórias assim: alguém gosta mais, se entrega mais e sofre mais. Esse lado da premissa é verdadeiro. Mas estou prestes a negar o outro lado, pasme: ser quem gosta menos não é mérito nenhum. Ser quem gosta menos também pode não ser problema nenhum, afinal, ainda não existe um SAC onde podemos reclamar da falta de controle emocional. Não dá para controlar. Mas dá para evidenciar. Ninguém nunca disse que sentimentalidade era um jogo e que ganharia quem tivesse mais cartas escondidas na manga: não é. Inventamos isso. E, sinceramente, foi uma das invenções mais infelizes da humanidade. 

E assim foi: caí. Depois de ter vivido na pele de quem gosta mais, achei que a solução era acatar o conselho de contenção. Eu tempestiva, que sempre fui dada aos excessos, me vi reprimida. Economizando afeto. Querendo ser quem gosta menos, quem demonstra menos, quem sente menos. Mesmo em erupção por dentro. Que perrengue! Tanto me reprimi que consegui. Me tornei o que me feriu e saí ferindo os outros. Me protegendo, eu dizia. Mentira. Farsa. Ferir o outro é, na verdade, ferir a mim também. Cada pessoa que machuco, é mais um passo que dou para o fundo do poço. Submersa, do fundo do poço foi que percebi: o problema não é gostar menos, é simular. É na simulação que o respeito se perde. Ninguém demonstra o que sente, um jogo em que ninguém joga limpo e, no final, todo mundo perde. Quando percebi, em choque, entendi: o que não faço ao outro, não quero para mim. Se o sentimento não existe, ou se está fraquejando, não há mal nenhum em dizer: eu não quero estar com você. Vai doer. Mas a verdade é o que tem que prevalecer: uma tempestade de uma hora, é muito menos dolorosa que um chuvisco de um mês. 

Eu, que nunca escolhi certo, me deixava guiar pelo medo cego da dor - em mim ou em outro alguém - aprendi que covardia não protege ninguém. E que reciprocidade, além de ser a ligação e resposta idêntica ao sentimento de alguém, é, sobretudo, a coragem de respeitar e não causar ao outro o que pra mim também não convém. Ao iludir o outro, da mesma forma, me iludo. A consideração e a bravura de dizer a verdade, é muito mais recíproca que um costume disfarçado de amor.  

Tentando devolver ao universo, o amor que recebo (texto sugerido pela Fran Nascimento)

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