Prédios. Carros. Transeuntes.
Faróis. Olha, o carro da pamonha. Buzinaram. A criança soltou o braço da mãe e
atravessou a rua correndo. A velhinha deu milho para os pombos. Caos urbano.
Em meio a essa bagunça, um rapaz
atravessava as ruas da cidade. Cabeça baixa, olhos esmaecidos e passos lentos.
Ele transitava como quem vai de lugar nenhum para nenhum lugar. Não era como se
estivesse cego ou surdo, sem perceber o que o cercava, ele apenas estava
alheio, e essa ignorância a respeito do mundo exterior era consciente e
provocada, ou melhor, era desejada.
Algumas pessoas recebem a sorte
de encontrar algo sublime ao ponto de transcenderem o rotineiro, e, depois
disso, fica difícil se envolver com a normalidade da vida. Foi exatamente isso
que acontecera com o rapaz. As cores das flores já não chamavam a atenção, as
magníficas construções arquitetônicas não passavam de cimento e vidro. Tudo era
menor se comparado ao que ele conhecera.
E tudo foi culpa dela, a dona do
sorriso que o despedaçou e depois o reconstruiu. Levou-o ao céu em segundos e
agora ele estava maravilhado. O brilho daqueles olhos abriu caminho para uma experiência
diferente, que outrora a monotonia da existência não o permitira imaginar. Era
um novo prisma, por isso as estrelas já não pareciam tão belas e nem a mais excelsa
obra de arte conseguia emocioná-lo.
O nosso personagem tinha a imagem
dela gravada nas córneas, e os ouvidos dele só escutavam a voz cristalina que
invadira os seus sentidos como uma cantiga. Essa música era embalada pelo bate-bate do coração e gerava a melodia
mais doce que os seres humanos podem encontrar.
Jessé Lima