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imagem: Pinterest

Não sei como aconteceu, mas mexi em alguma coisa lá dentro e meu relógio digital de pulso se alinhou ao meu relógio biológico interno: ele começou a despertar a cada sessenta minutos para me avisar a chegada da nova hora. Na verdade, são só dois bips: bip, bip. São bips rápidos, surdos e cortantes, mas são suficientes para me lembrar de que ainda não fiz tudo, de que ainda não terminei a página, de que ainda não escrevi um livro inteiro de cerca de trezentos e oitenta páginas. Os últimos dois bips aconteceram há uns dez segundos, exatamente quando eu havia fechado o livro e o colocado de lado. Acabei de ler trezentos e oitenta e cinco páginas em um rompante, buscando por iluminação. Não encontrei, fechei o livro e olhei todas as fissuras do teto por muito mais que trezentos e oitenta e cinco minutos. Não tive insight algum, nada me veio... Como é que um livro inteiro sobre escrita não me rendeu sequer uma linha? Nada!  Foi aí que me veio.

Nada consegue ser tudo e, em contrapartida, tudo consegue ser nada. Era o vô quem dizia isso enquanto olhava para mim, balançando na cadeira, e falando esse tipo de coisas como se eu, aos nove anos de idade, fosse capaz de entender. Ele repetia a frase sempre que eu me empolgava em planejar minhas cinquenta e cinco profissões. Quando cresci um pouco mais, comecei a achar que o vô desacreditava de mim, pensei que ele me achava incapaz de ser astronauta, bailarina, escritora e atriz... Mas agora, sem tempo, sem força e sem fôlego, depois de contar todas as marquinhas do teto, eu acho que o entendo.

Penso, agora, com mais calma no vô, em suas frases curtas e certeiras. Penso que ele teria me dito que li um livro inteiro sobre escrita e ele de nada me serviu porque é simplista, é um livro que tenta abarcar toda a história da escrita e acaba sendo reducionista: não me diz coisa alguma. E isso me leva a mim, tenho feito o mesmo, não escrevi um livro inteiro ainda porque quero abarcar tudo, e o que tudo quer ser, nada é. Não posso reduzir as coisas para que elas caibam no meu bolso, na minha vontade, no meu livro. Eu até posso falar sobre tudo, escrever sobre tudo, descrever todos os gostos, todos os cheiros, todas as dores, todos os amores que tive - além de inventar vários outros - mas um de cada vez. Um assunto por vez, um livro por vez, uma profissão por vez: um passo de cada vez, um pé atrás do outro.

Os meus pés até sabem caminhar, se eu deixar, eles se acertam e vão no tempo certo, mas com tanta gente correndo, com tanta gente chegando lá longe, com tanta gente fazendo tudo, com tanta gente conhecendo o mundo... Como posso eu caminhar devagar? De tanto tentar correr, acabei esquecendo como é o verdadeiro caminhar, o caminhar construtivo, o caminhar com os pés no chão e a cabeça na lua. O vô diria, eu suponho, que eu só tropecei, quebrei uns dentes, paralisei, mas que agora já posso tentar caminhar. É melhor assim: caminhar devagar, pisando com os pés espalmados no chão, sonhando com tudo, mas realizando um de cada vez. E melhor: é melhor caminhar olhando para o meu caminho, não para o do vizinho. Quem tudo quer ser, nada é.

Acabo tendo que agradecer a esse péssimo livro que li ("O mundo da escrita" - Martin Puchner) pela reflexão que tive. Acaba sendo assim: todas as experiências nos levam a algum lugar. No meu caso, é a literatura que sempre me faz caminhar.

Ane Karoline

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