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Saio nas ruas como todas as mulheres do mundo: super consciente de tudo, cuidando de cada passo, cuidando de cada respiração, pronta para correr, carregando nas costas o peso de progenitora da humanidade toda. Enquanto ando, sinto, vejo, escuto. Quando não as vozes, os olhares me dizem: ridícula, patética, enfadonha, penosa. Quando não os olhares, os gelos que recebo me dizem: chata, aporrinhante, importuna, irritante, desagradável. O que, na verdade, as vozes me dizem, é um coro claro: desnecessária. 

Mal sabem todos, que luxo seria esse que esses meus gritos fossem desnecessários. Não sei bem se mal sabem ou se mal querem saber. Afinal, vale alguma coisa minha vida, ou só vale mesmo o útero? 

É bem verdade, como me dizem os opositores, que  não fui oficialmente impedida de ir à escola, não fui oficialmente impedida de cursar universidade, não fui oficialmente inibida de trabalhar, não sou oficialmente obrigada a me comprometer com um matrimônio heterossexual. É bem verdade que muitas outras antes de mim passaram por todas essas situações, foram massacradas, pisoteadas, reduzidas a pó, sem voz e sem vez. A elas devo meu respeito e minha gratidão: me trouxeram onde estou. Todavia, minha luta agora é outra. A minha luta é contra frequente atitude de superestima em relação aos garotos nas escolas, é contra a supervalorização da masculinidade tóxica desde a mais tenra infância, é contra a hiper sexualização infantil (que é recai majoritariamente sobre meninas) é contra a redução de qualquer ser humano a funções biológicas, é contra a interrupção constante das falas públicas de universitárias, é contra a frequente atitude se subestimar pesquisadoras mulheres, é contra o tratamento diferenciando para o pai e para a mãe, é contra a falta de vagas de emprego para mulheres, é contra os salários mais baixos para mulheres que exercem as mesmas funções que homens, é contra a ideia única do matrimônio como finalidade da vida de uma mulher - e somente da mulher, nunca do homem... Sobretudo, é contra o discurso vazio e falacioso de que não existe mais sexismo, de que já há equidade entre os gêneros, de que não já discriminação ou, pior, violência sexual pesando sobre um gênero.  

Saio nas ruas e sinto, vejo e escuto. Sinto o medo que vem de mim e das outras, vejo o jeito silencioso dos olhares que recebemos - os quais nos devoram ou nos reduzem a nada. Escuto a ironia, a descrença e a subestimação cada vez que uma de nós se coloca. É por isso que a luta, apesar de ser a mesma, é outra: é a favor do incentivo à força feminina, é a favor da parceria entre mulheres, é a favor da liberdade feminina, é a favor do espaço para mulheres, é a favor da chance de ser, ao invés de cumprir um protocolo que, não necessariamente, me cabe, me acolhe, me expressa. 

Então, quando me questionam "mas ainda isso, em pleno 2020?" respondo: sim. É ridículo, patético, enfadonho, penoso, importuno, irritante, em pleno 2020 ter que ter esse tipo de conversa retrógrada, mas se há de fazê-lo, aqui estou, não apenas lutando, mas lutando como uma garota - procurando equidade, se não para mim, para as que vierem depois de mim. 

com amor, 
Ane  Karoline

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