Fonte: Tumblr
                Em nossos processos diários de relacionamento, muitas vezes acabamos por ignorar a noção de aprendizado em certos âmbitos. Um deles é o dos sentimentos. Em nossa sociedade, não temos o costume de ensinar, seja em educação formal ou empírica, sobre sentimentos. Digo isso como educador, e também com tio de uma criança de 7 anos. Não damos a atenção correta ao ensino dos sentimentos às nossas crianças, o que acaba por gerar adultos com dificuldades de se relacionar, ou de compreender e aceitar sentimentos alheios.
                O ideal seria que tivéssemos contato com uma educação que nos falasse de sentimentos, sobre como expressa-los, controla-los e principalmente identifica-los. A criança que chora por que não conseguiu vencer em uma brincadeira não sabe identificar que o que está sentindo não é raiva, e sim frustração. Muitas vezes, por confundir o sentimento, e até mesmo por não saber como expressa-lo, ela irá apelar ao choro, à birra, ou até mesmo à violência.
                Em reflexão, percebo que nunca um adulto veio até mim e nomeou sentimentos. Nunca ninguém me disse “Isso que você está sentindo se chama tristeza, e acontece por causa disso ou daquilo”. Então, onde foi que eu aprendi sobre esses sentimentos?
                Simples. Como as demais crianças, aprendi através de observação e reflexo. Via os adultos fazerem, lia histórias sobre isso, assistia a filmes e desenhos que me mostravam situações assim. Aos poucos, fui construindo a minha própria definição do que era cada um dos sentimentos, e de como poderia expressa-los. Hoje, adulto, depois de várias experiências, me pego refletindo sobre o quanto isso influi na formação das pessoas.
                Os sentimentos expressados em mídias digitais, entretenimento, música e livros podem, muitas vezes, vir acompanhados de uma dramatização que cruza o limite do real. Uma pessoa que assiste a um filme pode interpretar que em uma discussão gritos, berros e uso de palavras chulas é aceitável, pois foi o que aprendeu ali. Como leitor, pode idealizar as pessoas, criando um padrão alto na procura por um parceiro ou parceira.
                Hoje a mídia nos apresenta com ideias como vingança, machismo, heteronormatividade, entre outras ideias que são mostradas de forma casual, sem preocupação sobre o impacto na psique da mente em formação. Pode ser que ao ler sobre isso sintamos que não passa de problematização desnecessária. Contudo, é apenas através do raciocínio crítico que alcançaremos a reforma de nós mesmos e da sociedade.
                Ao idealizar as amizades, as relações familiares ou os relacionamentos, colocando relações mostradas em filmes, séries e outras mídias como “objetivo”, deixamos de lado a unidade de cada pessoa e de cada relação, e passamos a reproduzir comportamentos apresentados ali, moldando nossas personalidades para caber em caixas. Ora, se aquele casal que posta fotos lindas naquela rede social tem o hábito de escrever cartas um ao outro, toda semana, mesmo após anos de relacionamento, isso não quer dizer que devo inserir isso em minha própria relação.
                Esse tipo de comportamento deve se desenvolver de forma natural. Não quero dizer que não se deva apresentar a ideia ao parceiro e sugerir que o façam, mas que, caso aconteça, não deve vir em forma de imposição. Menos ainda a partir do uso de indiretas como “Aquele casal faz isso” ou ainda “O namorado da minha amiga sempre faz isso por ela”. Comentários como esse abrem espaço apenas para insegurança, possíveis discussões e pressão por colocar expectativas nos ombros do parceiro. Ao invés, podemos sempre dizer “Seria interessante se tentássemos fazer isso”, ou ainda “Acho esse habito adorável, o que você acha?”.
                O desconhecimento da forma correta de expressar esses sentimentos, nos leva a comportamentos como obsessão, controle e possessão. Há pessoas que associam se relacionar a possuir, controlar ou mandar. Para elas, a ideia de amor está distorcida. A mídia nos apresenta o amor que devemos “lutar” para ter. Mas a ideia de ter que lutar por alguém, ou por uma relação, por si só, está errada. Devemos sim, nos esforçar e empenhar na busca por um relacionamento saudável e equilibrado. Contudo, não devemos cruzar a linha do auto sacrifício ou anulação, para permitir que aquilo continue existindo.
                Daí temos o reflexo de filmes, séries e novelas, que nos apresentam uma ideia de protagonista que sofre, luta e enfrenta vários obstáculos na busca de um amor apresentado como perfeito, único e eterno. Um amor que sofre, supera humilhações, traições e todo tipo de mazela. Somos apresentados ao interesse amoroso perfeito, que é romântico, atencioso e que sabe ler a mente do parceiro. Com isso, acabamos por esperar uma relação dentro destes padrões.
                Isso nos leva a desvalorizar a comunicação e passar a fazer uso de artifícios, como indiretas, provocações e planos para “testar” a pessoa, ou ainda para que ela possa “provar” seu valor ou interesse. Sem perceber que, ao fazermos isso, há um desgaste, um distanciamento, do sentimento autêntico que inicialmente uniu aquelas pessoas. A fonte dessa confusão está mais uma vez, na distorção da compreensão do que se está sentindo, e do que se deve aceitar, em favor de uma relação.
                Na raiz, encontramos novamente a compreensão dos sentimentos. Retornando ao âmbito infantil, uma criança que aprende que, toda vez que expressar tristeza vai conseguir atenção, presentes e mimos, acaba por crescer e se tornar o que a sociedade tem chamado de “sadboys/sadgirls”. O termo em inglês, que se refere, em tradução livre, a garotos tristes e garotas tristes, respectivamente, refere-se a pessoas que se mantém em um clima de tristeza constante, na busca por receber atenção. Por vezes, forjam comportamentos e criam histórias, para obter o que querem.
                São o tipo de pessoa que faz comentários como “Sou feia”, “Ninguém nunca vai me querer” ou ainda “Não há nada de interessante sobre mim”, enquanto esperam receber uma palavra de elogio como recompensa por expressar aquilo. Essa insegurança e auto depreciação, acabam por afastar as pessoas, ou ainda torna-las alvo de pessoas que querem apenas uma “ficada”, mas não se relacionariam com alguém com esses tipos de comportamento, por sentir que, não há o que se possa fazer por aquela pessoa, ou ainda por não desejar se tornar responsável por alguém que precisa constantemente desse mimo.
                É importante observar que, não estou, de forma alguma, desmerecendo ou invalidando os sentimentos das pessoas. Me refiro especificamente às pessoas que o fazem em busca de fama ou validação. Vale observar que, de uma forma ou de outra, esse tipo de comportamento é tóxico. Como exemplo, há um rapaz que conheço que constantemente faz postagens com teor suicida/depressivo. Algumas vezes, respondia às suas postagens perguntando sobre seus sentimentos, se poderia ajudar, ou se havia algo que eu poderia fazer por ele. A resposta era sempre “Não, estou bem, só gostei e postei”.
                Contudo, uma amiga em comum também respondeu à postagem e, para ela, ele disse que estava se sentindo muito mal, que pensava coisas ruins, e por fim, sugeriu que ela saísse com ele e que pediu um beijo, que, segundo ele, o faria se sentir melhor. Não é difícil identificar a forma como ele agiu, ao analisar a resposta para um homem (que não representava interesse a ele), e uma mulher (de quem ele poderia obter algo). É a respeito desse tipo de comportamento que me refiro.
                Ainda falando sobre sentimentos negativos, há certos tipos de pessoas com as quais devemos tomar cuidado. Em minha experiência encontrei uma amiga que sempre falava sobre sua depressão e ansiedade. Eu, e outros amigos, tentávamos ajuda-la. Mas, logo percebemos um padrão em seu comportamento. Sempre que sugeríamos que ela fizesse algo para mudar a situação em que estava, ela colocava obstáculos. Não demorou para que percebêssemos que, não importava a solução que encontrássemos para que a situação dela melhorasse, ela rejeitava. Então, consultei uma amiga psicóloga, relatei o que estava havendo e segui o conselho dela de, evitar ouvir lamentos infundados, e oferecer ajuda para os momentos que realmente representavam perigo para a saúde/segurança dela.
                A melhora aconteceu em questão de semanas. Tanto eu, quanto meus amigos, paramos de ser audiência para lamentos fúteis, e passamos a ajudar apenas onde poderíamos, bem como sempre recomendar que ela procurasse ajuda profissional. Por fim, ela acabou o fazendo, e hoje a terapia é responsável por grandes conquistas em sua vida.
                Mais uma vez, encontramos aqui uma deficiência na compreensão dos sentimentos, e na forma como os expressamos. Por isso, advogo em favor de que, incluamos na educação das crianças, uma forma de ensina-las a quantificar, identificar e expressar seus sentimentos. Com isso, teremos ainda a vantagem de estar enfrentando a opressão que o machismo impõe perante os sentimentos dos homens. Com uma melhor compreensão do que sentem, seria mais fácil a prática da empatia, o que influenciaria na vida da sociedade.
                Há apenas benefícios em permitir que profissionais adequados ensinem tanto a adultos quanto a crianças a respeito de sentimentos. Uma correta compreensão destes configura mais um degrau em direção a uma sociedade mais pacífica, com uma visão mais humanitária e um senso de comunidade que nos permita crescer em unidade. Enquanto isso não acontece, cabe a nós refletir e tentar introduzir em nosso dia a dia a compreensão dos nossos próprios sentimentos, na busca constante por melhorar e viver uma vida que vale a pena viver.

- Adolfo Rodrigues


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