O mandamento, ou conselho, maior; aquele que deveria governar todos os outros; se perdeu. Uma prática que, de tão simples, não consegue ser praticada: amar ao próximo como a ti mesmo. Amar o próximo o suficiente para respeitá-lo e permiti-lo sê-lo quem é. Amar o próximo o suficiente para não  ser capaz de torturá-lo a ponto de fazê-lo odiar a si mesmo. Esse amor, genuíno e fraternal, que é dito, repetido, e pregado, existe, muitas vezes,  só no discurso. Quando é hora de praticar, existe uma exclusão: se o próximo for homossexual, nao vai dar para amá-lo. Mas por que? 


Sobre essa prepotência em achar que se pode escolher quem é digno ou não de amor, escreve o ex Padre Krzystof Charamsa em seu livro " A primeira pedra. Eu, padre gay, e minha revolta contra a hipocrisia da Igreja Católica". Além de abordar a homofobia sofrida pelas pessoas homossexuais por parte da comunidade não-cristã, Charamsa, destaca, primordialmente, a crueldade da Igreja Católica para com essas pessoas. O livro não é escrito por um leigo, todo o discurso do autor é embasado cientifica, historica e sociologicamente, além de ter todo o peso de ser escrito por alguém que conhece a Igreja Católica minuciosamente e que, portanto, tem pleno domínio para falar sobre o assunto. Krzystof Charamsa, além de padre e professor em Universidades Católicas, trabalhou diretamente para o Santo Ofício da Igreja (saindo em 3 de outubro de 2015). Um padre que construiu carreira dentro da Igreja, trabalhou fielmente, para, então, perceceber que jamais seria aceito por essa mesma igreja. 


Unida com toda a poesia e sinceridade presentes no livro, está uma reflexão valiosa sobre o estudo de gêneros e a importância do entendimento acerca da homossexualidade, a desmitificação sobre o poder  de julgamento acerca sexualidade alheia. O autor discute que a homossexualidade, apesar de estar diretamente ligada à sexualidade, vai muito além disso: é a essência de alguém como um todo, não uma preferência ou uma inclinação à perversão. De muitas frases marcantes presentes no livro, escolho essa para resumir bastante do que é dito no livro e convidar a todos vocês, meus leitores, a uma reflexão: "Dos outros se herda a homofobia; a homossexualidade é dada". 



Em apoio ao seu discurso que criminaliza, com razão, o repúdio às pessoas homossexuais, o autor ressalta vários problemas e contradições dentro da Igreja: a falta de amor, a competição venenosa entre as pessoas, a falsidade, a grande quantidade de padre gays existentes dentro da igreja, o alto número de menores e freiras abusados por padres. Ainda assim, ao contrário do que se pode pensar, existe um discurso espiritual muito forte e sensível no livro. A ideia de um Deus justo e amoroso, que não julga e nem apedreja se sobressai à ideia de um Deus punidor muitas vezes disseminada pela Igreja. Dentre toda a hipocrisia citada pelo padre, ele menciona a resistência do alto clero com relação ao atual Papa Francisco - que é considerado muito liberal e um "progressista irresponsável". Traz diversos trechos de discursos do atual Papa em contraponto com atitudes crueis do Clero. 


Tentando não correr o risco de estragar a surpresa do livro, me limito a dizer que é um livro manifesto; divisor de águas entre os tempos. É um manifesto em nome da insustentabilidade da homofobia. É um livro delicado, escrito por alguém que cansou de escrever sua vida nas entrelinhas. Um livro escrito como uma revolução para aqueles que nunca tiverem direito de existir, aqueles que sempre foram torturados, julgados, humilhados e maltratados. É preciso, sim, falar sobre sexualidade e estudo de gêneros. É preciso repeitar e dar voz aqueles que sempre foram amordaçados. Não basta acolher, igreja, tem que aceitar. Não existe cura gay, homossexuais não estão doentes, adoecida está uma sociedade que distorce o discurso, de alguém que jamais julgou alguém, dito há 2000 anos atrás. Ninguém tem o direito de julgamento sobre a sexualidade de ninguém. Se um casal homossexual te incomoda, quem deve procurar ajuda médica é você. Quem sabe você não vem engolindo pílulas de discurso de ódio a vida inteira sem questionar? 


INFORMAÇÕES SOBRE O LIVRO:
autor: Krzystof Charamsa
editora: Seoman - Grupo Editorial Pensamento
ano: tradução, 2017
minha nota: 10

Com todo o meu amor, 
Ane Karoline

2 Comentários

  1. Olá!
    Não conhecia esse livro e achei maravilhoso, as pessoas são tão hipócritas, mas Deus está observando tudo e só no juízo final as contas serão acertadas. Ninguém tem cacife para falar quem merece ou não o amor de Deus, eu sinceramente não entendo isso, não só os católicos mas também os evangélicos que muita das vezes são mega agressivos com essas pessoas, cheias de discurso de ódio, mas Deus sabe de todas as coisas. Gostei da sua resenha e quero conferir esse livro que querendo ou não é polêmico rsrs..

    beijos!
    https://blogdatahis.blogspot.com.br/

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  2. Olá!
    Não conhecia esse livro e achei maravilhoso, as pessoas são tão hipócritas, mas Deus está observando tudo e só no juízo final as contas serão acertadas. Ninguém tem cacife para falar quem merece ou não o amor de Deus, eu sinceramente não entendo isso, não só os católicos mas também os evangélicos que muita das vezes são mega agressivos com essas pessoas, cheias de discurso de ódio, mas Deus sabe de todas as coisas. Gostei da sua resenha e quero conferir esse livro que querendo ou não é polêmico rsrs..

    beijos!
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