No domingo veio a Cláudia, uma velha amiga da minha mãe, nos convidar para
o seu casamento. Fazia tempo que não a víamos. Uns dez anos. Eu era criança,
ela universitária. A lembrança que eu tinha de Cláudia era de uma moça meio
triste, meio cansada. A cabeça sempre baixa. Mas no domingo, quando ela chegou,
quase não a reconheci. Ela chegou falando alto, sorrindo, cabeça levantada, postura
ereta. Os olhos brilhavam. Ela falou, falou e falou do casamento. Vez ou outra
mudávamos o rumo da conversa: “tem visto a Joana? Ouvi dizer que ela se mudou.
Foi tentar a vida na Itália, a família dela é de lá”. Cláudia, por sua vez,
conseguia colocar o Grande Dia em qualquer assunto: “Sim, ela me disse. Eu
disse para o Gustavo, meu noivo, que em Maio – o mês do nosso casamento, é
primavera na Itália. Eu queria passar a Lua de Mel em Verona, a cidade de Romeu
e Julieta. Mas, para isso, precisaríamos poupar dinheiro. Está tudo tão caro,
não está? Mas o primo do Gustavo trabalha em uma dessas empresas de aviação,
ele pode conseguir passagens mais baratas...”. E assim foi o domingo inteiro: a
noiva fazendo planos e as outras mulheres e mocinhas presentes suspirando a
beleza da paixão. Cláudia voltou para sua casa e eu, me aproveitando dos rastros
de paixão deixados, me pus à olhar, inebriada, pela janela que tinha vista para
a rua. De repente, a prática do casamento me parecia muito bonita. De repente,
relacionar-se me parecia simples e doce. De repente, gritos: um rapaz gritando
com uma mocinha na rua. A moça, assustada e envergonhada, calava-se na
tentativa de não piorar a situação. O rapaz repetiu alguns insultos, virou as
costas e andou, deixando sozinha a possível namorada. Minha garganta deu um nó.
Alguma coisa aqui dentro morreu. Deus é rápido. Domingo, primavera, umas seis
da tarde. Hora que o céu fica meio rosa, meio azul. Dia da visita apaixonada da
Cláudia. E Deus joga, bem na frente da minha casa, duas pessoas que se ferem em
nome do amor, na tentativa de me lembrar que até o otimismo exagerado pode
fazer mal. Seriam eles exceção? Quase me recompus. Instantaneamente, lembrei de
tantas outras histórias de namoros, noivados e casamentos que perderam o
brilho, com o tempo. Suspirei. Eles não são exceção. Cláudia e Gustavo é que
são.