"O silêncio foi a única verdade que você me contou..."

       Faz quase dez anos desde o dia em que você entrou em minha vida. Eu ainda era uma criança, inocente e sem ideia do que era amar. É claro, eu já havia tido relacionamentos antes de você, mas, nenhum foi tão intenso ou profundo. Havia algo em seus olhos, em seu cheiro, em seu toque, que era completamente diferente de qualquer outra pessoa que já conhecesse. Você me fez sentir amado, importante e venerado. Eu amava a forma como você me tratava e olhava para mim. 
        Senti uma felicidade que vazava pelo meu peito, e o sorriso no rosto era uma constante em minha vida. Passávamos horas conversando, e você nunca parecia se cansar de mim. Quando eu percebi já era tarde demais. Eu estava apaixonado, e dependente de você. Você se movia, e eu reagia. Você respirava perto de mim e eu entrava em êxtase. Me levou para viver tantas aventuras.
        Nunca vou me esquecer das noites em que nos víamos escondidos, trocando beijos em cantos afastados, para que ninguém soubesse sobre nós. Correndo de madrugada, de mãos dadas e rindo em uníssono, enquanto o mundo ao nosso redor dormia. Mas isso não durou muito, durou? Por quase um mês eu vivi num paraíso que sequer posso descrever. No entanto, tudo isso ruiu, e a sua face verdadeira logo apareceu.
         Tudo começou com uma mentira simples. Por mais inocente que eu fosse, não me tome por tolo, eu soube na hora que era uma mentira. Mas, me enganei e me convenci de que você logo me contaria o real motivo por trás daquela mentira. Nunca aconteceu. E de repente eu estava o tempo todo atrás de você. Sentia que estava te incomodando a cada mensagem que mandava. Eu sentia você escorrendo entre os meus dedos, e tive medo de te perder. Havia uma necessidade de estar com você que queimava dentro de mim. Uma vontade de passar cada minuto contigo e me assegurar que você não me deixaria, ou me trocaria. Que não se cansaria de mim. Então você voltou de uma breve viagem, e não me contou nada. Me viu dias depois, com uma mentira pronta, me dispensando.
          Você nunca vai saber a tempestade que se instaurou em minha mente naquele tempo. Caminhei para casa mortificado, vazio e frio. Desde a primeira mentira, ao nosso término, tudo o que eu sentia estava amplificado. E quando você se foi, deixou uma marca feia no meu coração. Eu fui atrás de você, é claro, você era meu ar e meu sol. Mas você me tratou com frieza e indiferença, sequer fez questão de esconder o desprezo. Eu via esperanças cada vez que você respondia a uma mensagem, cego demais para ver a verdade em minha frente. Não é à toa que dizem que o amor é cego. 
            Mas enfim você me deu o último adeus, rejeitando minha proposta para tentarmos mais uma vez com um "não" seco e direto, que fez minha garganta arder de tanta dor. Te superar foi algo dolorido, demorado e cheio de erros e atitudes impulsivas. Demorou até que você parasse de habitar meus sonhos e meus pensamentos. Demorou quase um ano para que eu fosse capaz de me relacionar com alguém novamente, tamanho o dano deixado. Mas não acabaria ali, não é?
          Novos caminhos se abririam para mim, novas pessoas a adentrar minha vida, relações longas e felizes, outras curtas, porém bem vividas, mas todas com algo faltando. Eu não notei a progressão daquilo, mas, pouco a pouco, o apego, a confiança, a vontade e disposição me largavam. Cada novo relacionamento via uma versão minha menos disposta a se entregar, menos confiante, menos apegada e mais facilmente levada a términos. Nenhuma deu certo, e ninguém nunca mais terminou comigo depois de você, pois eu jamais deixava chegar a esse ponto.
          Um dia desses, quase dez anos depois da nossa história, me pego encarando a figura no espelho e notando que o que faço com as outras pessoas é reflexo do que você fez comigo, e percebo que aquela marca feia que você deixou, me contaminou. Aquela marca nunca me deixou, nunca se curou e nunca deixou de agir dentro de mim. Tornei-me exatamente aquilo o que me feriu. Me peguei brincando e fugindo de sentimentos, incapaz de verdadeiramente sentir algo por alguém. Me notei encerrando relações sem sentir um pingo de saudade ou arrependimento, ou sequer voltar a pensar naquelas pessoas que estiveram comigo.
          Foi quando eu percebi que aos poucos aquela marca me contaminou e me tornou doente como você. Uma doença de falta de amor ou consideração, de descrença e futilidade. Um verdadeiro desamor. Hoje eu olho para as suas atitudes e noto que eu faria o mesmo no seu lugar, porque hoje eu sou exatamente igual à pessoa que você era quando partiu o meu coração. Um coração que jamais havia sido partido antes. Hoje eu sou quem você era, e não tenho mais cura.
          Hoje sou eu quem contamina outras pessoas, lhes parte os corações e vai embora sem olhar para trás, como você fez comigo. Aquele que enche alguém de esperanças, apenas para se cansar delas e partir sem me importar com o estrago deixado. Hoje eu sou a pessoa que faz os outros odiarem meu perfume, ou serem incapazes de ouvir determinada música, porque hoje eu sou igual a você. Mas você não é mais aquela pessoa. Você encontrou alguém para amar. Se assentou e construiu algo para si. Deixou para trás a vida de destruidora de corações, e seguiu em frente, deixando para trás um rastro de pessoas devastadas, com as quais você não se importa, algumas das quais sequer se lembra. 
          Egoísmo seu, sim. Vivemos em mundos diferentes agora, universos. E eu sequer lembro da sua existência, a não ser quando olho para dentro e enxergo o que me tornei. Sou seu sucessor, seu herdeiro, o próximo na linhagem dos destruidores de corações. Acho até que deveria te parabenizar. Afinal em um espaço de tempo de um mês você plantou uma semente que, alguns anos depois daria origem ao que sou.

Parabéns, você criou um monstro...

- Adolfo Rodrigues

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