Procuro-me, pois me perdi de mim mesmo em alguma multidão. Por que a cada manhã eu dou bom dia a uma versão diferente de mim no espelho. Por que na tentativa de agradar a algumas pessoas, mudei. Por que a inocência de tempos atrás eu perdi. Por que pedaços de mim eu deixei para trás. Procuro-me por que não reconheço o estranho que dorme em minha cama, veste as minhas roupas e vive a minha vida. Procuro-me, por que ainda não consegui entender o por que de coisas que eu faço. 

Procuro-me por que muito me doei, me permiti, me entreguei, me dobrei, me reparti. Por que muito fiz por quem nada retribuiu. Por que importância dei a quem não a merecia. Procuro-me por que sou mudança que anda. Metamorfo. Inconstante. E não me acho. Por que não paro quieto. 
Hoje estou aqui, amanhã sou rastro. Fujo de mim me escondendo entre horas e minutos. Não consigo me alcançar por que estou sempre correndo. Ergo a mão para tentar alcançar uma versão minha que já está no futuro. E ele não olha para trás, por que o que ele quer não vem de lá. Me procuro por que me escondi atrás de muros, barreiras. Me perdi em florestas de sentimentos abstratos, regados a lágrimas em noites escuras e frias e iluminados por sóis gerados por sorrisos. Mas às vezes os sorrisos eram falsos, criados por paliativos que mais me faziam mal do que bem.  
Me procuro por que me meti em meio a uma multidão de personificações da minha existência. A tristeza que caminha ao lado da solidão, inseparáveis. A alegria, que parece sempre ocupada demais para estar onde eu estou. O prazer, nas pequenas coisas, que parece aparecer menos e menos pra me cumprimentar. E em meio a esse emaranhado de gente eu me vejo escapar pela porta dos fundos. Corro atrás de mim, mas não me alcanço, e, sem perceber, continuo a prosseguir no meu caminho, atrás de alguém que, ao perseguir, me leva em frente. E quando vejo já passou. Superei. Estou em outra, vivendo para o futuro. É por isso que, procuro-me. 
Se me achar, me segure. Eu busco a domicílio. 
 Adolfo Rodrigues

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